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Imagem de Nossa Senhora da Conceição Aparecida encontrada no Rio Paraíba do Sul, em Aparecida-SP | |
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Os católicos, de uma forma geral, têm muito carinho pela Mãe de Jesus (chamada de “Nossa Senhora” pelos devotos). É impossível falar de fatos religiosos no Brasil sem mencionar a devoção a Nossa Senhora da Conceição Aparecida, a padroeira do País.
Basta uma visita ao Santuário Nacional, na cidade paulista de Aparecida (erradamente chamada de Aparecida do Norte), no vale do rio Paraíba, para se ter um verdadeiro resumo da cultura nacional. De turistas curiosos a peregrinos em oração fervorosa, de autoridades a pessoas simples, todos parecem como que atraídos a uma das demonstrações mais genuínas de fé do povo brasileiro.
A história dessa devoção é muito rica, tanto em documentos quanto em doces contos populares. Tentarei dar aqui a versão considerada oficial. O relato aqui é baseado nos escritos de Pe. José Alves Vilela, vigário da vila de Guaratinguetá-SP entre os anos de 1725 a 1745, e publicados no livro “Um santo para cada dia”, de Mario Sgarbossa e Luigi Giovannini (Editora Paulus).
O começo
Na segunda quinzena de outubro do ano de 1717, o governador de Minas e São Paulo, Dom Pedro de Almeida (chamado de Conde d’Assumar), em viagem a Minas Gerais, passaria pela Vila de Santo Antônio de Guaratinguetá (atual Guaratinguetá).
Para prover os banquetes em homenagem ao conde, a Câmara convocou os pescadores da região para que conseguissem o máximo possível de peixes para o ilustre visitante. Entre os muitos convocados, estavam Domingos Garcia e João Alves Garcia (pai e filho), e Filipe Pedroso (cunhado de Domingos). Depois de uma noite inteira de trabalho, percorrendo grande distância do rio Paraíba do Sul, nada havia sido pescado.
Na altura do Porto de Itaguaçu, já nas últimas esperanças de se conseguir algo, João Alves lançou a rede. Ao puxá-la para a canoa, viram no meio da malha uma imagem de Nossa Senhora da Conceição, moldada em barro, sem a cabeça. Depois de guardar a peça com cuidado, mais adiante lançaram a rede novamente. Puxaram uma bola de barro. Era a cabeça da imagem. Estava completa a pequena escultura enegrecida pela lama do rio Paraíba.
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Porto de Itaguaçu, local onde foi encontrada a imagem de Nossa Senhora Aparecida |
João Alves novamente lançou a rede. Para espanto de todos, a malha se tornou pesada a ponto de arrastar o barco. Com dificuldade, os três trabalhadores conseguiram tirá-la do rio, desta vez, repleta de peixes. O sucesso da pescaria foi tanto que os homens, receosos de sofrerem um acidente, tiveram que jogar no rio os objetos pessoais.
A devoção
Após o encontro, a pequena imagem negra foi consertada com cera e levada para a casa de Felipe Pedroso, que construiu para ela um oratório de madeira. Assim começou a devoção a Nossa Senhora da Conceição Aparecida. Depois de algum tempo, foram construídas capelas no local do primeiro retábulo. Em 24 de junho de 1888, foi bento solenemente o templo que hoje é chamado de “Basílica Velha”.
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Basílica Velha |
No dia 8 de setembro de 1904 (Festa da Natividade de Nossa Senhora), a pequena imagem recebeu uma coroa doada pela Princesa Isabel. Em 1929, no encerramento do Congresso Mariano, Maria foi aclamada como rainha do Brasil e passou a ser oficialmente chamada de Nossa Senhora Aparecida. Em 31 de maio de 1931, na cidade do Rio de Janeiro (capital da República na época), diante de várias autoridades, inclusive do presidente Getúlio Vargas, leu-se o decreto do Papa Pio XI, proclamando oficialmente a Mãe de Jesus como rainha e padroeira do Brasil.
Em 1967, o Papa Paulo VI enviou ao santuário de Aparecida a “Rosa de Ouro”, um símbolo do respeito do Pontífice para com pessoas e locais que ajudam a dar dignidade à Igreja. Esse presente do Papa encontra-se hoje no museu, na torre da gigantesca basílica, chamada de “Basílica Nova”.
No dia 14 de julho de 1980, em sua primeira visita ao Brasil, o Papa João Paulo II consagrou a “Basílica Nova”. O maior templo do mundo dedicado à Virgem Maria e um dos maiores da Igreja, com cerca de 23 mil metros quadrados de área construída e com capacidade para cerca de 47 mil pessoas.
Alguns milagres
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Vista noturna da Basílica Nova |
Quem visita a Sala dos Milagres, no subsolo da Basílica Nova, fica impressionado com os objetos deixados por devotos do Brasil e do mundo, lembrando alguma graça alcançada pela intercessão de Maria. Além da própria pesca milagrosa, na ocasião do encontro da imagem, alguns fatos tornaram-se célebres. Conheça alguns:
O milagre das velas – O pescador Filipe Pedroso, depois de conservar a imagem de Nossa Senhora em sua casa, doou a pequena escultura ao filho, Atanásio Pedroso. Este também construiu um retábulo, ao redor do qual, todos os sábados, o povo das proximidades juntava-se para rezar o terço. Certa vez, mesmo com a noite serena, as duas velas colocadas no altar se apagaram. Antes que uma senhora, de nome Silvana da Rocha, acendesse as velas, estas recobraram o fogo simultaneamente. Segundo Pe. José Alves Vilela, esse foi o primeiro milagre (citado no livro “Um santo para cada dia”, de Mário Sgarbossa e Luigi Giovannini, Ed. Paulus, p. 326).
O escravo liberto – Um dos mais comoventes milagres registrados em Aparecida deu-se com o escravo Zacarias. O pobre cativo fugira de uma fazenda no Paraná, mas foi capturado na região do Vale do Paraíba. Ao passarem perto da pequena capela de Nossa Senhora Aparecida, o homem, preso por correntes e argolas, pediu para rezar diante da pequena efígie da Virgem Maria. A fé de Zacarias foi tanta que as argolas e a corrente arrebentaram e caíram aos seus pés. Por esse milagre, o escravo ganhou a liberdade e, segundo a tradição, tornou-se um dos devotos da Senhora Aparecida. O museu anexo à Basílica Nova conserva, como prova do fato, as correntes quebradas.
Barrado na porta do templo – Enquanto os anos se passavam, aumentava também o número de romeiros que se dirigiam ao santuário de Nossa Senhora Aparecida. Também crescia a desconfiança e o ódio de alguns poderosos que desprezavam o povo. Certa vez, um senhor que cultivava profunda repugnância pela fé e pela Igreja saiu de Cuiabá e dirigiu-se ao santuário de Aparecida. Sua intenção era a de entrar a cavalo no templo e quebrar a pequena imagem. Mas as patas do animal ficaram presas na rudez da pedra da escadaria da igreja. Conta-se que, desse dia em diante, o senhor converteu-se e passou a ser um fiel seguidor de Cristo e devoto de Maria. Esse fato é testemunhado pela própria pedra, conservada também no museu na torre da Basílica Nacional. Na rocha, pode-se ver o contorno de uma das ferraduras.
Visão recuperada – Dona Gertrudes Vaz vivia com sua filha em Jaboticabal, no interior de São Paulo. Um parente, de nome Malaquias, tinha o costume de peregrinar a Aparecida e voltava contando casos de milagres que se viam naquele santuário. Depois da insistência da menina, que era cega de nascença, as duas resolveram empreender uma peregrinação até a igreja dedicada a Nossa Senhora. À custa de esmolas e de semanas de viagem, conseguiram chegar ao destino. Ainda na entrada da cidade, a menina perguntou com simplicidade se a igreja que estava avistando no alto do monte era a de Nossa Senhora Aparecida. Com espanto, a mãe indagou à filha o que havia acontecido, e a menina disse que uma luz repentina clareou a vista. Segundo os registros, esse caso aconteceu no ano de 1874.
É uma pena não se poder mais ver de longe a antiga basílica. Por ganância de alguns, falta de senso histórico e artístico de outros, além da incompetência de muitos, o templo antigo foi cercado por prédios de pouquíssimo valor arquitetônico, encobrindo também um pouco da história do Brasil.
Saiba mais
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Papa Francisco em visita ao Santuário Nacional (24 de julho de 2013) |
- Interessante notar que o “apelido” Aparecida dado a Nossa Senhora tem
origem na crença de que ela havia aparecido nas redes e não sido
pescada.
- Pescas milagrosas, passagens riquíssimas de
simbolismo, também são relatadas nos evangelhos. Veja em
São Lucas, capítulo 5, versículos 1 a 11, e
São João, capítulo 21, versículo 6 a 11.
- Para saber mais sobre a devoção a Nossa Senhora Aparecida, uma opção é o portal de Aparecida. Nele é possível saber mais sobre a devoção, curiosidades, fotos e muito mais. O endereço é
www.a12.com.
- Sempre é bom esclarecer que a devoção não é à imagem da Padroeira do Brasil, mas à própria Virgem Maria. A imagem é tratada com o devido respeito porque, segundo a fé católica, foi por ela que Deus quis dar um recado à humanidade, em particular aos brasileiros. Quando um cristão, inclusive o católico, adora imagens ou outros símbolos, ele comete uma aberração.
- Para a Igreja, Maria e os santos intercedem por nós, são solidários com nossas causas. Quem opera milagres é somente Jesus.
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Veja a homilia do Papa Francisco, pronunciada na visita que ele fez ao Santuário Nacional, em julho de 2013.